Para Sempre Alice, Glatzer e Westmoreland


Tímido e despretensioso, Still Alice (me recuso a usar essa tradução horrível) chegou ao circuito sem muito hype em volta. A falta de marketing exagerado faz com que o espectador vá ver o filme sem muitas expectativas e qualquer filme acima da média o deixa surpreso, mas quando o filme é muito acima da média, deixa todos espantados com a qualidade obtida. Esse é um grande exemplo.

Alice é uma professora universitária que sofre de Alzheimer precoce. Condição possível, embora muito rara. Ironicamente, ela é uma estudiosa do desenvolvimento cerebral humano. Alice está no auge de sua carreira quando começa a ter alguns sintomas da doença, ainda que ela não faça a relação de imediato. Após algumas consultas, intercaladas com episódios de esquecimento repentino, o diagnóstico é racionalmente recebido, sem aquela procissão de choro que geralmente os filmes criam para provocar tristeza em quem assiste. Alice então se prepara para viver com a perda de memória: anota bilhetes no celular e faz exercícios de memória. O ponto alto da história começa quando ela deixa um vídeo para si mesma, gravado em seu computador, onde dá instruções para uma futura debilitada ela mesma de como cometer suicídio e evitar seu próprio sofrimento. A colocação desse vídeo na história e a relação que se espera dele é, de uma forma distorcida, lindo.

O elenco principal do filme é constituído de 3 atores: Julianne Moore, Alec Baldwin e Kirsten Stewart. Admito ter um grande preconceito contra esses dois últimos e Still Alice serviu para curar o meu problema com Alec Baldwin. Ainda tenho minhas diferenças com a Stewart. Moore está encantadora no papel principal. Ela dá um grau de vulnerabilidade espantosamente real, como se espera de pessoas nessas situações. Risos nervosos, mãos incertas... Tudo na figura de Alice parece ter sido pensado, tornando o Oscar recebido pelo papel altamente merecido. Alec Baldwin está ótimo como o marido que tenta tomar as rédeas da situação. Em nenhum momento aquele sorriso de canto de boca característico do ator me lembrou outro papel que ele tenha feito. Considero isso um bom feito. Kirsten Stewart é... bem, ela é sem graça, lamento. Pode ter sido a primeira atriz a ganhar um prêmio de cinema francês, mas essa atriz que os franceses viram não estava ali. Clichê mencionar a falta de expressão dela, mas estava ali o tempo todo. Se feliz ou triste, era necessário contexto prévio para decidir. Já na primeira cena a decepção aparece e inevitavelmente já se começa a imaginar uma dúzia de atrizes jovens que fariam o trabalho de uma maneira superior. Talvez seja exagero meu, talvez não, mas acredito que um elenco mais bem escolhido poderia ter garantido uma vaga entre os indicados a melhor filme já que o filme não peca muito em outros aspectos.

O filme tem um clima muito intimista, com muitas cenas de interior e poucas imagens em panorama. A câmera está sempre bem próxima aos personagens, dando a impressão de inclusão no ambiente, não como observador. Uma coisa bem legal que reparei foi a evolução da composição de cena. No começo é uma imagem normal, as cores estão ali e nada salta aos olhos. Em momentos de esquecimento de Alice, o mundo ao redor da personagem sai de foco, mantendo apenas ela visível, deixando bem claro a ideia de ciência de si mesma mas não do ambiente em que está. É agoniante as vezes, sim, mas é tocante. As cores vão ficando mais claras ao decorrer do longa, chegando a momentos de uma claridade branca incômoda, mas repleta de significado.

"Hey Alice, eu sou você. Se estiver assistindo isso, significa que chegou naquele ponto onde não consegue mais responder a nenhuma das perguntas(...) O próximo passo é o mais lógico. No seu quarto tem uma cômoda com um abajur azul. No fundo da primeira gaveta dessa cômoda, tem um frasco cheio de comprimidos com uma etiqueta escrito 'tome todos com água'. Sei que há muitos comprimidos no frasco mas é muito importante que engula todos."

Still Alice, na minha opinião, merecia um lugar entre os indicados ao Oscar de melhor filme. É lindo, bem feito, pensado e muito bem escrito. Mesmo que você não conheça ninguém que sofra da doença, é inevitável a simpatia imediata com a protagonista e sofrer junto com ela, sabendo que não há melhora futura para o problema. No discurso de recebimento do Oscar, Moore pediu mais atenção aos portadores da doença, mas acho que o filme já faz esse trabalho involuntariamente. Saí da sala de cinema refletindo muito sobre como difícil deve ser a vida de quem possui a doença e quão doloroso deve ser ver um parente ser privado de suas memórias, definido por Alice em um certo ponto como “o bem mais precioso de alguém”.

Eu não tenho como estar exagerando. Esse é um filme belíssimo que será lembrado quando o assunto estiver sendo discutido. A propósito, cuidado com salas de cinema repletas de pólen. Saí com meus olhos lacrimejando. Coisa estranha. Deve ser pólen mesmo...

2 comentários:

  1. Adorei seu texto. Deu vontade de assistir o filme.
    *-*

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    Respostas
    1. Certeza que não vai se arrepender, Cintia. É lindíssimo! Depois me conta o que achou.

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