Deuses Americanos, Neil Gaiman

A primeira vez que eu ouvi falar de Deuses Americanos, na verdade eu o vi. Um amigo meu, durante algum dos estranhos anos do colegial, estava lendo e dizendo coisas boas sobre ele, coisas que eu não lembro; esqueço as palavras, mas lembro do sentido delas. Naquela época, eu não conhecia direito os trabalhos do Neil Gaiman, e a capa de Deuses Americanos me deixou meio blasé. Fui redescobri-lo apenas depois dos estranhos anos do colegial, depois que li minha primeira edição de Sandman e que eu precisava, como uma necessidade alimentícia, ler mais e mais dos trabalhos de Gaiman. Acabei conseguindo uma excelente promoção num site deveras conhecido da internet, onde comprei 4 livros dele por um preço muito camarada. E mesmo com essa necessidade, Deuses Americanos foi sempre ficando para depois, aquele reino encantado onde deixamos tudo aquilo que não queremos fazer agora. Mas o acabei pegando para ler agora, neste último mês de 2014, e aproveito o vazio causado para escrever minhas impressões.

Um pouco antes de começar a lê-lo, pensava que Deuses Americanos era uma versão americanizada de Lugar Nenhum, obra que eu mesmo já resenhei há alguns meses. Entretanto, logo ao terminar o primeiro capítulo, percebi que estava muito enganado a seu respeito: Deuses era mais em todos os sentidos. Mais longo. Mais intenso. Mais adulto. Mais incrível. Mais admirável. Muitos leitores consideram este livro o melhor da carreira de Gaiman e agora entendo muitíssimo bem o porquê.

O livro todo tem um tom estranho, como se só as coisas necessárias para aquele momento estivessem sendo mostradas, com o ar de mistério pairando sobre o leitor do mesmo jeito que paira sobre os espectadores durante uma peça de teatro, esperando ver quem será o próximo ator a entrar e quais serão as mudanças de cenário no próximo ato. Isso te faz grudar no sofá, na cadeira, na cama, e virar as páginas em busca de mais respostas, de mais mistérios.

E o tema é absurdamente genial. Neil Gaiman sempre trabalha com o conceito de entidades mágicas em suas obras, em coisas tão incrivelmente loucas que fazem muito sentido, e Deuses não fica para trás nesse quesito. Imagine que todos os povos que foram para os Estados Unidos levaram, junto com eles, seus deuses, sua fé, sua cultura, e imagine que esses deuses se instalaram nos Estados Unidos, se alimentando dos rituais feitos por aqueles que acreditavam neles, dos sacrifícios, das oferendas. Imagine também que esses mesmos deuses, com o passar do tempo, foram ficando mais fracos porque as pessoas paravam de acreditar neles e começavam a louvar outras divindades. Divindades como a mídia, como o computador, como a autoestrada. Divindades novas para tempos novos e modernos, onde a crença deixa de seguir o antigo e prossegue com o que é real, com o que é novidade, com o que tangível. Imagine então que vai acontecer uma tempestade e que os deuses novos estão se preparando para exterminar os deuses antigos e declarar, de uma vez, que os Estados Unidos, essa terra desolada que não foi feita para os deuses, pertence a eles. Imaginando tudo isso, você acabou de chegar na espinha dorsal de Deuses Americanos.

A história conta tudo isso a partir da visão de Shadow, um presidiário que está prestes a ser libertado devido a bom comportamento. Um dia antes de sua liberdade, ele é levado até o diretor da prisão que o deixa sair mais cedo por motivos de força maior: a mulher de Shadow, Laura, acabou de morrer. Shadow, então, sai da prisão e pega seu caminho para comparecer ao enterro de sua mulher, até que um velho ruivo, de terno claro e gravata, aparece em sua vida lhe oferecendo um trabalho. Seu nome é Wednesday e ele é um pilantra. Depois de uma fase de negação, Shadow acaba aceitando trabalhar para o senhor Wednesday, servindo de um faz tudo para ele. Wednesday, obviamente, é uma das divindades antigas (mesmo que você não saiba qual logo de cara), e ele parte com Shadow ao seu lado numa road trip em busca de outras divindades antigas, alertando-as para a guerra iminente e fazendo com que elas se unam a sua causa.

Lendo o livro através da visão de Shadow, aquele que não sabe absolutamente nada das coisas, o clima de mistério e de suspense é sempre presente. Gaiman, durante o livro, vai deixando pistas para que, antes mesmo dele dizer o que está acontecendo e quem é quem, o leitor consiga desvendar algum desses mistérios, o que não torna somente o livro interessante no ponto de vista da temática, como também muito divertido de ser lido.

Deuses Americanos é um livro que me surpreendeu e que deixou aquele vazio característico de quando você termina de ler um bom livro e não sabe mais o que fazer da vida. Ele tem Gaiman surtado em várias características (o que é algo maravilhoso), tem divindades de várias culturas mundiais, tem suspense, tem comédia, tem personagens carismáticos, tem inúmeros plot twists, principalmente nas últimas duas partes do livro, e tem filosofia. Minha recomendação neste exato momento é a seguinte: leia-o o quanto antes, pois é uma experiência incrível.

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