Frank, Lenny Abrahamson

Filmes sobre música sempre acabam rendendo uma boa história. Seja por meio de clássicos, como os musicais, ou de filmes mais modernos, como Whiplash, o tema está sempre em bom momento de ser discutido e, dado a constante transformação da música, nunca há a escassez do assunto. Frank é uma história singular no meio de um universo já muito explorado. E os resultados foram ótimos. E inéditos.

Jon é um músico. Ou quase isso. Ele enfrenta problemas para compor canções por conta de seu bloqueio criativo. Ele, por acidente, acaba indo parar numa banda de nome impronunciável (porém “digitável”) The Soronprfbs. No primeiro número musical do filme já se nota que tipo de banda eles são: estranha! Com sonoridade altamente experimental, o elemento surpresa ainda é Frank, o vocalista. É um homem que usa uma cabeça gigante. Os motivos ou o rosto de Frank são um mistério. Após o show, eles vão para uma casa na mata para gravar um álbum para a banda. O processo é tão incomum quanto se espera: eles fazem uso de galhos, baldes e pás para criar sonoridade e tudo é visto como genialidade de Frank. O período se prolonga e a convivência não fica mais fácil. Problemas (grandes!) ocorrem. Jon, que filmava relances do processo criativo de Frank, traz visibilidade à banda e a chance de tocar no SXSW, importante festival independente do Texas, o que contraria toda a banda exceto Frank, que parece empolgado com a oportunidade.

Então o que há de especial no filme? Bom, nada é tão simples como descrevi. O longa inteiro é uma calamitosa interação de personalidades opostas e no meio disso tudo está Frank que é, obviamente, autista. A ideia da cabeça é brilhante! É a única maneira como ele consegue interagir com as demais pessoas e é, ao mesmo tempo, o que traz individualidade e fama à banda por meio dos vídeos de Jon. Clara, personagem de Maggie Gyllenhaal, é a pessoa mais próxima a Frank e quem lida com ele de melhor forma. Ela o acalma e essa relação parece fraternal. Jon, gradualmente, passa a assumir tal papel por causa das dissidências entre os músicos provenientes das brigas constantes. O resultado é catastrófico já que Jon, ainda que com boas intenções, é apenas um intruso. O resto eu deixo para sua avaliação.

“It’s really nice to see ya. It’s nice to be here. I love your wall.”

O elenco principal do filme é muito sólido e bem escolhido. Michael Fassbender está excelente! Uma das melhores cenas, no final do filme, fica claro o quanto é bom ator. Mesmo sem ver o adorno é notável que ele é o Frank por conta de toda expressão corporal. Não que eu precisasse de prova da qualidade de Fassbender, mas se alguém ainda precisava, está ali. Eu não conhecia Domhnall Gleeson, mas o papel de músico com bloqueio criativo caiu-lhe muito bem. Ele tem um aspecto de músico britânico natural e sua relação com Frank soa inocente, embora prejudicial. Os outros dois músicos não são atores de destaque mas têm seu mérito por saberem tocar os instrumentos de seus personagens e conseguirem isso com muita naturalidade. Conseguem ser mais críveis que a própria Maggie que, por sua vez, soa exagerada. Quase caricata. Isso é algo a ser responsabilizado à direção, mas não causa danos ao filme.

Um aspecto muito interessante que reparei foi na interação de Frank com o mundo. A cabeça, usada desde criança por ele, tem uma função ambígua. É uma maneira de Frank se esconder do mundo, ocultando sua face e, ao mesmo tempo, o único meio com o qual ele consegue interagir com o mundo ao seu redor. É, ao mesmo tempo, o que o isola e o que o integra. É algo que o retém e o liberta. A cabeça funciona como uma poética, porém clichê, metáfora: as pessoas conhecem Frank, e em determinado momento, o amam, pelo que veem, mas a cabeça não é Frank. Há um homem, complexo e inseguro, por baixo e poucas pessoas o conhecem. Poucas pessoas se deram ao trabalho de conhecê-lo, criando a famosa situação “solitário no meio da multidão”. É tanto cruel quanto bonito.

Acima de música, autismo ou relações, Frank é um filme que trata de amizade. Ele aborda a maneira mais pura do relacionamento, motivado apenas pelo simples “gostar de alguém”. Do começo ao lindo final, é uma belíssima homenagem a um dos mais belos sentimentos, que é, inclusive, exaltado por Frank em um número musical emotivo com uma letra que vai de “I love your wall” a “I love you all” por causa de um simples olhar de seus amigos. Para assistir com seus amigos. Músicos ou estranhos, mas amigos.

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