Sobrevivente, Chuck Palahniuk

"Testando, testando. Um, dois, três.Testando, testando. Um, dois, três. Talvez isto esteja funcionando. Não sei. Não sei nem se você consegue me ouvir. Mas se você consegue me ouvir, preste atenção. E se estiver prestando atenção, então o que você encontrou é a história de tudo o que deu errado. Este é o chamado gravador de dados de vôo pertencente ao vôo 2039. A caixa-preta, como as pessoas chamam, embora ela seja cor de laranja, e dentro dela há um monte de fios que é o registro permanente de tudo o que restou. O que você encontrou é a história do que aconteceu."

É quase impossível manter a imparcialidade quando falamos de um autor cujo estilo de escrita e ideologia já conhecemos tão bem. Isto se torna mais forte quando se trata de grandes escritores como Chuck Palahniuk, que possui um grupo fiel e devoto de leitores de seus livros. Permitindo-nos visitar novamente sua mente genialmente criativa e crítica, Chuck nos traz uma obra alucinadamente eletrizante e sarcasticamente ácida, que é um de seus melhores romances.

Sendo direto e objetivo em sua mensagem anarquista e libertadora de amarras sociais, logo no primeiro parágrafo o protagonista Tender Branson, um homem que, em uma atitude desesperada, sequestra um avião com a intenção de cometer suicídio. Antes, enquanto o avião ainda possui combustível, ele decide contar a história de sua vida para a caixa-preta. Tender é o sobrevivente de uma seita religiosa extremamente opressora que cometeu suicídio em massa, porém ele conseguiu fugir antes do acontecimento, fazendo com que se sentisse obrigado a adentrar o “mundo real”. Então, Tender tem que se adaptar às regras de nossa sociedade contemporânea e, acima de tudo, entendê-la. Enquanto faz isso, ele também trabalha para rede de "auxílio aos suicidas", incentivando as pessoas que ligam a cometer suicídio.

"Eu simplesmente não queria ser tratado. Qualquer que fosse o meu problema, eu não queria que ele fosse curado. Nenhum dos pequenos segredos dentro de mim queria ser encontrado e explicado. Pelos mitos. Pela minha infância. Pela química. Meu medo era: o que restaria? Então nenhum dos meus ressentimentos e temores verdadeiros veio à luz. Eu não queria solucionar nenhuma angústia. Jamais quis falar da minha família morta. Expressar a minha dor."

A discussão da existência supérflua e até ignorante do ser humano é, assim como em todos os livros de Chuck, um de seus maiores pontos. Ao sermos colocados no ponto de vista de um indivíduo cujo conhecimento de mundo não passava das cercas de onde vivia junto a sua seita religiosa, recebemos diversas reflexões sobre a fragilidade moral de uma sociedade onde “parecer” ganha mais destaque e apreço do que o realmente “ser”.
Aqui temos a religião tratada como uma sátira dúbia e contraditória, levantando a questão de que é algo importante para manter a mente do humano centralizada a seguir a vida com boa índole. Porém, estamos falando de um livro escrito por Chuck Palahniuk, então vemos a face caótica e destrutiva que a religião impõe ao indivíduo que a segue cegamente, nos trazendo justificativas hipócritas para atitudes que agem contra os direitos humanos e, muitas vezes, o bom senso.

Outro fato interessante a ressaltar é o fato de o livro ser numerado em contagem regressiva, tanto na numeração das páginas quanto na dos capítulos. Isto contribui para a imersão do leitor na atmosfera claustrofóbica que cerca toda a trama, relevando uma sensação de urgência e angústia ao decorrer da história, principalmente ao nos aproximarmos de seu fim.

Dizer que uma obra de Chuck Palahniuk é obrigatória chega quase a ser redundante. Seu estilo único – autodenominado de “ficção transgressiva” – leva o leitor a refletir sobre o que lhe é apresentado, com momentos cômicos que nos tira uma risada desconfortável devido à situação em que foi colocada. O Sobrevivente não é apenas uma leitura obrigatória para os fãs do autor como também é uma de suas melhores obras, relevando todas as qualidades e características que fizeram com que essa legião de fãs se apaixonassem por seu talento incomparável depositado em sua escrita voraz.

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