O livro dos esnobes, W. M. Thackeray




O livro dos esnobes é um destes textos raros que fazem com que repensemos nossa forma de olhar para as relações humanas. Escrito por Thackeray (1811 – 1863) numa Inglaterra que acaba sendo dissecada e analisada minuciosamente pelo autor, “O livro dos esnobes” apresenta um personagem que realiza uma crítica social, política e comportamental.

O cenário é a Inglaterra vitoriana e o narrador é um jornalista fracassado que começa a escrever compulsivamente para conseguir se manter. Este é W. M. Thackeray, autor e ao mesmo tempo narrador da obra. Seus relatos têm intenção de objetividade e caráter não ficcional, porém, o retrato que ele pinta parece às vezes tão pitoresco que acaba por revelar mais sobre o autor do que sobre os esnobes que ele descreve. 

Este movimento textual é extremamente sedutor e o fato do autor admitir que ele próprio é um dos esnobes dos quais fala nos coloca em cheque em vários momentos. Existem cenas nas quais nos perguntamos sobre sua veracidade; parece que alguém ressentido com a estrutura social de seu tempo narra as piores mazelas que observa, o que inicialmente nos coloca em uma posição cética. Mas imediatamente nos recordamos que ele próprio se inclui neste círculo de relacionamentos fúteis, trivialidades sociais e gentilezas exageradas. 

Outra característica curiosa da obra é que ninguém é esquecido ou poupado, seja o rei ou aqueles que servem a mesa. Os anfitriões de banquetes são os mais atacados, mas a crítica não deixa de fora nem mesmo os rapazes ricos e belos que eram os objetos de desejo de todos que compunham estes banquetes. Sequer os homens do campo passam incólumes e, como foi dito, nem o autor é isento de suas próprias críticas.

“Lacaios, tão absurdamente presunçosos em um momento e tão abjetos no outro, nada mais são que a representação de seus senhores neste mundo. Aquele que admira torpemente as coisas torpes é um esnobe – talvez esta seja a definição segura desses personagens.”

Mesmo a obra tendo sido escrita há mais de um século, sua atualidade é impressionante. Considerando a forte crítica à submissão pela autoridade, podemos vislumbrar mais sobre o presente do que gostaríamos de admitir. A utilização de títulos de nobreza ou relacionamento com pessoas que possuem cargos importantes é outro ponto relevante, especialmente quando utilizados como referência para atuações sociais e como salvo-conduto para círculos mais fechados.

“No domingo passado, estando na igreja desta cidade e tendo a missa recém terminado, ouvi dois esnobes conversando sobre o pároco. Um deles perguntava ao outro quem era o clérigo. “Ele é o Sr. Fulano de Tal”, o segundo esnobe respondeu, “capelão doméstico do conde de Qualquercoisa”. “Oh, é mesmo?”, disse o primeiro esnobe, com tom de indescritível satisfação. A ortodoxia e identidade do pároco foram estabelecidas, de imediato, na mente daquele esnobe. Ele sabia tão pouco sobre o conde quanto sobre o capelão, mas aceitou o caráter deste em base à autoridade do primeiro; e foi para casa bem contente com Sua Reverência, como um esnobezinho submisso.”

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