Guelã, Maria Gadú



"Me encontro em feliz nova era."

Curioso e experimental, o novo álbum de Gadú capta, com bastante ousadia, alguns sons que ainda não se encontravam em seu repertório típico da mpb. Bem se sabe que, no início de sua carreira, Gadú apresentou músicas para a grande massa, conquistando seu público, sendo a maior parte dele composta por jovens. Ficou mais conhecida ainda entrando em uma trilha ou outra de novela, mas hoje ela tem confiança o suficiente para dar a seus fãs um trabalho bruto e inexplorado.

"Guelã", cujo significado ainda não descobri, transborda leveza e poesia. A cantora coloca na mesa um amadurecimento musical espantoso, brincando com as palavras em suas composições. Algumas músicas carregam o instrumental por dois minutos sem deixar a peteca cair, não deixando a desejar ou causando tédio em momento algum.

"Suspiro" abre o álbum com cordas suaves, dando espaço para a voz grave de Maria anunciar que seu novo tempo chegou. E, nesse tempo, a cantora prova que entende do que faz, criando um movimento intimista em suas canções. Letras que refletem a rua, a vida, o corpo e as emoções do ser humano. Poesias cantadas com lentidão delirante, pausadas, sem pressa para acabar o momento.

O projeto é um trabalho genuíno de alguém que deseja mostrar que não é mais aquela jovem imatura que muitos achavam linda quando apresentava "Shimbalaiê". Essa garota cresceu e faz música de verdade. É uma mulher, como em "Ela", uma homenagem à feminilidade. O ritmo urbano ecoa em "Tecnopapiro", confesso que quase me fez lembrar do Emicida, uma melodia marcada, voz potente e a letra escrachada sobre a relação de uma mãe e sua filha. Aqui e ali é indispensável a presença de seu violão, recordando o estilo acústico que a consagrou.

A única faixa não autoral do disco é "Trovoa" (foda, desculpa a palavra), numa releitura tão sedutora que é possível sentir a presença de Gadú ao nosso lado, sussurrando no ouvido. Em um momento que muitos artistas preferem contratar letristas, alguém ter um álbum praticamente todo sob sua escrita é um feito muito lindo.

"Guelã" é isso, um quarto trancado onde a própria cantora vai abrindo a cortina e nos deixando ver fiapos de seu mundo, numa luz ofuscada pelo silêncio e suspiros de sua alma. Um sorriso tímido para todos aqueles que disseram que ela era apenas mais uma genérica da nova mpb. Que ela nos dê mais álbuns como este. Pessoal, misterioso e sensual.

"Dois pontos negros no céu
Focam seus olhos no mar
Tendo o silêncico no peito
Lendo o silêncio com os olhos
Faço silêncio de mim"

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