Clube dos Cinco, John Hughes





Sábado, 24 mar 1984. Shermer High School, Shermer, Illinois. 60062.
"Caro Sr. Vernon, aceitamos o fato de que nós tivemos que sacrificar um sábado inteiro na detenção pelo que fizemos de errado ... e o que fizemos foi errado, mas acho que você está louco por nos fazer escrever este texto dizendo-lhe o que pensamos de nós mesmos. Que te importa? Você nos enxerga como você deseja nos enxergar ... Em termos mais simples e com definições mais convenientes. Você nos enxerga como um cérebro, um atleta, uma paranoica, uma princesa e um criminoso. Correto? Essa é a maneira que nós nos víamos, às sete horas desta manhã. Passamos por uma lavagem cerebral."
Há quem ouse dizer o contrário, porém é quase definitivo: ninguém entendeu a adolescência tão bem quanto John Hughes. Após escrever grandes clássicos como Gatinhas e Gatões (1984), A Garota de Rosa-Shocking (1986) e o imortal Curtindo a Vida Adoidado (1986), seus filmes moldaram a visão sobre os adolescentes dos anos 80. A sua obra prima, entretanto, chegou em 1985 com um clima mais denso, profundo e questionador, apesar de não perder o bom humor sobre esta conturbada fase da vida.

Somos apresentados a cinco pessoas diferentes, desconhecidas uns para os outros, que precisam comparecer a escola no sábado para cumprir detenção por má conduta escolar. Cada uma dessas pessoas representa um estereótipo do adolescente americano: A popular, o atleta, o vândalo, a esquisita e o nerd. Indivíduos que, a primeira vista, pertencem a mundos completamente opostos, o que leva a diversos momentos de atrito, até que, pelo desenrolar da trama, acabamos tendo a perspectiva de vida e desconstrução de cada um. Em contrapartida, acompanhamos um breve momento de questionamento do diretor responsável por mantê-los em disciplina dentro da sala de aula sobre o que mudou em relação a sua juventude e a atual.

A delicadeza durante a construção e desconstrução de todos seus poucos personagens ocorre de forma completamente natural e orgânica por meio de excelentes diálogos e cenas memoráveis, como a dança ao som de We Are Not Alone. E por falar em música, a trilha sonora oitentista conversa perfeitamente com cada situação e com o contexto geral de todo o filme. Ao sermos introduzidos ao filme com a música Don’t You Forget About Me e a frase da música Changes, de David Bowie (que, inclusive, foi creditado como contribuidor criativo do filme, uma singela homenagem de John Hughes ao cantor que o influenciou por meio de suas músicas), captamos toda a essência que será despejada durante os 90 minutos de filme. Changes é considerado, por muitos, o hino da adolescência. Contudo, deve ter sido substituído por Heroes, também de David Bowie, por conta do filme As Vantagens de Ser Invisível, que é considerado o melhor filme sobre a adolescência desde O Clube dos Cinco, onde suas influências são diretas e visíveis.
"E essas crianças em que você cospe, enquanto elas tentam mudar o mundo delas, são imunes às suas consultas. Elas sabem muito bem o que está se passando" (David Bowie)
O principal ponto levantado por Hughes é: o que é ser adolescente? Aquela fase onde se tem conhecimento de tudo, porém não sabe de nada. A transição entre a infância e a vida adulta que continua sendo subestimada pelos mais velhos, só que de forma mais discreta. E, acima de tudo: qual é a diferença entre os adolescentes? Este momento de descoberta que, quase sempre, define quem somos e seremos pelo resto de nossas vidas, nosso primeiro passo no mundo selvagem da competitividade, das responsabilidades sociais e emolduração de nossa personalidade. Suas roupas, as músicas que ouve, os livros que lê, as pessoas com quem anda, tudo que irá te enquadrar na maneira pré-programada e preconceituosa perante o olhar de outras pessoas.

Antes de todos estes questionamentos, temos a base de tudo: nossos pais. Nossa casa, nossa família, onde iremos aprender o certo e errado, iremos nos espelhar em suas experiências, temeremos o que eles temem, até chegarmos à idade da razão onde essas amarras são destruídas pela busca da independência. Logo no início do filme, quando somos apresentados aos nossos cinco personagens, vemos uma breve aparição de seus pais: o que mima, o que pressiona, o que superestima, o que ignora e o que mal está presente. Enquanto todos estão discutindo sua relação com seus pais, surge o pensamento: Iremos ficar igual nossos pais?

Por fim, existe diferença entre os adolescentes? E o mais importante: a adolescência é diferente com o passar das gerações? Após irmos desmontando nossos personagens camada por camada, podemos perceber que, por mais que pertençam a grupos diferentes, além da influência irrevogável de seus pais, o adolescente ainda assim mantém as mesmas dúvidas e as mesmas inseguranças. E quanto as inesgotáveis alegações de pessoas da geração passada de que “a juventude não é mais a mesma”? Acho que a atemporalidade de O Clube dos Cinco pode responder este pensamento, porém, se não for o bastante, o diálogo final entre o diretor Richard Vern e o zelador Carl encerra esta discussão: “os jovens não mudaram. Você mudou”.

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