2:37 - É Só Uma Questão de Tempo, Murali K. Thalluri














Lembro-me perfeitamente da primeira vez em que assisti a esse filme. Eu estava no sétimo ano do fundamental, a primeira coisa que me chamou a atenção foi a capa de seu DVD: simples e objetiva, trazia apenas uma jovem sentada no chão, agarrada aos próprios joelhos e cabisbaixa. A frase de efeito também era chamativa: "É SÓ UMA QUESTÃO DE TEMPO". Eu não sabia bem o que esperar quando o coloquei para tocar, só achava que seria legal, mas para meus singelos quatorze anos foi um confronto sem medidas.

Quase oito anos após tê-lo visto pela primeira vez, as cenas ainda mexem comigo. Mesmo sem reassistir constantemente, já que a última vez que o vi foi em 2012, ele me faz pensar sobre várias fases da minha vida. Sendo seu primeiro e já audacioso filme, Thalluri capta a alma das personagens em cenas brilhantes, delicadas e muito realistas, em parte devido ao fato de ter algumas experiências de sua própria vida.

Durante o longa acompanhamos a rotina de seis estudantes de uma escola de ensino médio. São exatamente 2:37 da tarde e a porta do banheiro feminino está trancada. Por debaixo da porta um fio de sangue vem descendo e se transforma em todo o sofrimento que vem a seguir. Alguém se matou, mas só conhecemos sua verdadeira identidade nos últimos momentos. Até lá muita coisa nos aguarda e vamos conhecendo os jovens que poderiam ter findado sua vida e seus motivos.

Melody (Teresa Palmer) e Marcus (Frank Sweet) são os primeiros protagonistas que nos são apresentados. Seus pais viajam muito à negócio, por isso vivem praticamente sozinhos. Ela tem sérios problemas de timidez, não fala muito, tem poucos amigos. Ele é um nerd que quer ser reconhecido por seu pai e assumir um dia a empresa da família. Ambos não se falam muito, Melody tem certo temor do irmão, uma vez que Marcus faz tudo o que pode para se destacar e ela não quer estar no meio disso. 

Através de depoimentos bem sinceros e fragmentos do dia a dia de cada um, vamos conhecendo Luke (Sam Harris), o astro principal do futebol da escola e Sarah (Marni Spillane), sua namorada e, com uma ponta de clichê, a garota mais popular da escola. Steven (Charles Baird) tem seu sonho brasileiro, ser como o Pelé e se tornar um prodígio do futebol, tendo esperanças contra sua deficiência e acreditando que um dia chegará lá.

Sean (Joel MacKenzie) encontra nas drogas aquilo que sua família lhe tira, um sossego e um tormento que serve de gancho para nos levar a outro personagem, criando um ciclo chocante e não esperado. Kelly (Clementine Mellor) é notada de forma tímida, como a menina amiga de todos e que todos podem contar. Todo o elenco tem uma sincronia e atuações dignas de elogios infindáveis.

Com todos os protagonistas entregues, somos arrastados para um turbilhão de sentimentos. Todas as dificuldades da juventude se misturam de uma forma traumatizante na vida de cada um. Com cenas em flashback, vemos o dia deles até a fadada hora 2:37, situações normais como um café da manhã e subir a escadaria da escola viram torturas diárias nesse que pode ser chamado sem medo como o melhor drama juvenil já feito. Incesto, abuso sexual, aborto, desunião familiar, bulimia, doenças, sexualidade, drogas, amizade, bullying são lançados sem piedade na tela em cenas cruas e cativantes. As histórias se cruzam e as ligações entre os personagens começam a ser expostas, revelando os segredos mais sombrios de cada um.

Cada jovem tem dentro de si um monstro procurando ser liberto. Cada um possui seu motivo, seja ele o de querer ser especial, seja para ser assumido em um romance ou para conseguir se livrar da culpa que os padrões ideais de beleza exigem de alguém. Os status sociais não podem ser rompidos, a casta estudantil não pode ser envergonhada. Uma das cenas mais marcantes é um dos depoimentos em que Melody diz ter apadrinhado uma garotinha africana, depositando uma quantia x semanalmente para ajudá-lá, mas quando seu pai descobre ela precisa parar. Há um grito preso em sua garganta, um pedido de ajuda em que ela só consegue escapar dando a sua mão para alguém, mesmo que para ela não exista nenhuma mão estendida.

Como tema presente, o suicídio é encarado por cada um de uma forma diferente. Um considera covardia alguém colocar fim em si mesmo, outro, um ato de coragem. Penso eu que tudo seja mais uma questão de escolhas. É impossível julgar alguém baseado nas nossas próprias opções. O que pode ser suportável para fulano, para mim pode ser o fim de tudo.

Toda a crueldade é transferida pelos personagens em cenas chocantes de ofensas e agressões físicas uns com os outros e, naquele tempo, ainda não havia ocorrido o boom das redes sociais na internet, tornando tudo mais pessoal graças ao corpo a corpo necessário para depreciar o colega.  O final é absolutamente chocante, mesmo anos depois eu ainda não acredito que aquele foi o fim e me pergunto "Por quê logo fulano?".

Foi quando me dei conta de que algumas pessoas não conseguem viver bem consigo mesmas até quando estão rodeadas de amor. A depressão é abordada sutilmente, mas está em cada toque de piano da melódica trilha sonora. Ainda um fantasma a ser decifrado, não se brinca com depressão e não há muitas explicações para justificar quem sofre deste mal. A tristeza em se viver pode ser maior do que o medo de encarar a morte antes da hora.

Com um impulso repentino, resolvi falar sobre esse filme, acho que TODOS deveriam vê-lo em algum momento de sua vida. Não fiz questão de o reassistir para escrever sobre, o tenho nitidamente em minha memória. Ele me ajudou a entender vários pontos em que dantes tinha dúvida.  Como ele não é um filme conhecido, a experiência de passar por ele fica ainda mais louca e ele passa a ser uma espécie de achado.

Atualmente tenho indicado-o para alguns amigos, pois não posso ser o único a mergulhar nesse emaranhado emocional. Um público que sem nenhuma dúvida irá gostar são os fãs de "As vantagens de ser invisível". pois acima de tudo ele é um filme sobre vitória em meio aos fracassos.

1 comentários:

  1. Li essa resenha em um grupo e resolvi ver o filme depois por que gostei muito, parabens, o filme é muito bom e o texto passou tudo.

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