O Homem de Palha, de Robin Hardy





“E o Deus verdadeiro? O que acontece com Ele?”

Considerado um clássico do suspense, “O Homem de Palha” é um daqueles raros filmes que propõem um questionamento real ao telespectador. Polêmico, o filme trouxe uma situação incomum e uma profunda reflexão sobre a religião, confrontando o senso comum. Logo no começo, conhecemos o sargento Howie, que recebe uma carta relatando um suposto desaparecimento de uma jovem na remota ilha de Summerisle. Ao chegar lá, o sargento, sem perceber, é envolvido numa misteriosa trama que culminará em um surpreendente desfecho.

O sargento é um homem que segue a doutrina cristã com muito fervor, elevando sua moral religiosa acima de tudo. Porém, ao chegar em Summerisle, depara-se com diferentes costumes advindos de uma religião pagã. A população da ilha cultua os velhos deuses e possui uma peculiar afeição ao sexo, sobretudo ao falo. É um pecaminoso confronto construído em cenas que valorizam a natureza da ilha e os belos (alguns bem sensuais) cultos pagãos. A religião cristã é colocada como uma mera estrangeira na ilha, contrapondo-se ao senso comum de religião dominante. Howie e seus conceitos cristãos são rebaixados ao nível de turista e, algumas vezes, motivos de risos e confusão por parte dos nativos. Um delicioso (e pecaminoso) confronto que faz o próprio telespectador questionar-se: “E o Deus verdadeiro?”.
“Eu acho que eu poderia me transformar e viver com os animais. Eles são tão plácidos e auto-suficientes. Eles não ficam acordados no escuro chorando por seus pecados. Eles não me deixam doente discutindo seus deveres para com Deus. Nenhum deles se ajoelha para outro de sua própria espécie que viveu há milhares de anos. Nenhum deles é respeitável ou infeliz, por toda a terra.” – Lord Summerisle
Afinal, quem é o Deus verdadeiro? O seu ou o meu? O filme não centraliza-se nisto, mas Howie é constantemente confrontado, porém inabalável até o fim, sobre tal questão. E crê, com todo o poder de seu ego, que o seu Deus é o verdadeiro. Portanto, o sargento vê toda a cultura religiosa da ilha como uma aberração, como algo profundamente errado. Há moças peladas correndo pelos campos (ou pulando fogueiras), há crianças aprendendo a arte do amor, há pessoas cultuando, falando e cantando sobre o sexo. E as músicas... ah, essas merecem uma atenção especial. Em certos momentos, “O Homem de Palha” parecerá um musical, há longas cenas onde a música torna-se central, e os temas das canções só poderiam ser o bipolar caminho que vai ora para o céu, ora para o inferno, que é o sexo. São belas, sensíveis e melódicas canções construídas nas mais variadas metáforas, de uma maneira sempre sutil (algumas nem tanto) e elegante.

“O Homem de Palha” é um fino suspense, beirando ao terror para alguns (imagine um evangélico vendo uma moça pelada clamando por sexo... pois é!), que lhe encantará e, muito provavelmente, lhe chocará também. Contrapondo-se ao conceito de terror na época (para quem não sabe, 1973 é também o ano de lançamento do clássico “O Exorcista”), “O Homem de Palha” trocou o banho de sangue e a escuridão por um bizarro suspense a céu aberto, com muita beleza e luminosidade. O surpreendente final nos faz chegar à conclusão de que, mesmo tão diferentes entre si, as religiões confrontadas colocam o seu ego nas estrelas até o fim, seguindo seus cultos sem qualquer limite em nome de um Deus (ou deuses), na velha filosofia de que “os fins justificam os meios”.

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